EDITORIAL

Por Heloísa Sousa
06/06/2023

A Revista Farofa Crítica chega a sua quinta edição e segue com seus objetivos de divulgar pesquisas, relatos e pensamentos sobre a produção artística; priorizando as artes da cena e as descentralizações. A proposta de que cada dossiê lançado se debruce sobre alguma temática, nos faz percorrer lugares diferentes das criações artísticas, conhecer outros horizontes e democratizar perspectivas que, possivelmente, não teriam outros espaços de compartilhamento. Partindo de nossos interesses de pesquisas ou ainda da percepção de lacunas temáticas, eu e Diogo Spinelli, como editores da Revista Farofa Crítica, elencamos títulos para os dossiês e investimos na busca por colaboradores pelo Brasil.

A partir desta edição (v.3 n.1), decidimos que a Revista seguirá com publicações anuais, a fim de que possamos ter mais tempo para produção e organização de um material consistente e que sirva para outros artistas, pesquisadores e interessados nas discussões sobre o campo artístico.

Aliado ao meu trabalho como pesquisadora e crítica de teatro, também me apresento como diretora de teatro em Natal (RN) e destaco meu interesse por essa prática. É justamente esse interesse que me faz observar como as teorias e discussões sobre as práticas de encenar e dirigir ainda necessitam de mais espaços e estímulos. Muitas pesquisas, teorias e textos já foram publicados sobre a atuação, a dramaturgia e a história do teatro; outras áreas ainda parecem estar tomando fôlego de amplificação das discussões. Apesar da prática da direção teatral ser tão antiga quanto outras que estão implicadas nos processos criativos, a compreensão de um encenador, e de um teatro onde o diretor é também autor da obra, só se consolida a partir do início do século XX e dos registros de um teatro moderno. No Ocidente, diretores como Antonin Artaud, Constantin Stanislavski, Bertolt Brecht, Gordon Craig, entre muitos outros, passam a escrever ou registrar os pensamentos sobre suas proposições de teatro, o que passa diretamente pelas suas práticas e elaborações como encenadores. As metodologias e procedimentos, portanto, se confundem com as palavras sobre os tipos de teatro possíveis, suas éticas e políticas.

A produção teórica sobre a direção teatral segue em produtividade. Se pensarmos ainda sobre a contemporaneidade e a produção teatral de artistas vivos e residentes no Brasil em nosso tempo, podemos analisar suas proposições, metodologias e formas de elaboração, para termos aportes históricos e também contornos dos caminhos possíveis para o fazer teatral e sua relação com os espectadores.

Reconhecendo esse campo de interesse e sua relevância, a Revista Farofa Crítica lança esta edição com o dossiê “Direção Teatral”, publicando seis textos sobre e/ou a partir de práticas de diretores e diretoras de teatro ainda vivos e atuantes em nosso tempo.

Abrimos este dossiê com o texto “A Abstração nas Artes” de David Atencio, traduzido por mim para esta edição. O texto é parte da pesquisa de mestrado do encenador chileno, onde desenvolve o que nomeia de Metodologia da Abstração aplicada nas obras que Atencio dirige para a Série ABSTRACTO da Tercer Abstracto, programa binacional de pesquisa em teatro. O texto traz, de modo objetivo, as etapas metodológicas praticadas pelo diretor e que apontam para uma possibilidade de aplicação do conceito de abstração para o teatro. A tradução e publicação desse texto nos traz a possibilidade de conhecer melhor as estratégias adotadas por Atencio em suas encenações, que ganham expressividade prática e teórica no Brasil através de processos de criação no país e desenvolvimento de pesquisas acadêmicas.

Também vinculado ao Tercer Abstracto, Mateus Fávero, co-diretor do programa, publica sua entrevista com Matías Feldman, realizada originalmente em espanhol. Fávero que é dramaturgista, ator e pesquisador reconhece uma aproximação entre as práticas como pesquisa da Tercer Abstracto e da Cia. Buenos Aires Escénica, esta última dirigida por Feldman. A entrevista com o encenador argentino mostra as aproximações que ele observa entre o teatro e as pesquisas científicas, destacando a relevância das metodologias e do compartilhamento das investigações com o público através da própria encenação.

Outro encenador que aparece em nossa edição é Tadzio Veiga, performer e diretor do Teatro da Matilha e do Teatro da Destruição em São Paulo (SP). O jovem encenador escreve sobre suas elaborações conceituais e pesquisas sobre a dissolução do eu e sobre o corpo sem órgãos – esta última, ideia do dramaturgo, ator e diretor francês Antonin Artaud; para pensar a direção de seus trabalhos com os grupos a quem associa suas criações. Os pensamentos e práticas de Veiga apontam para uma cena híbrida entre o teatro, a dança e a performance; além de enfatizar olhares subversivos sobre as identidades e os processos de identificação.

Considerando outros apontamentos para a direção teatral, publicamos ainda o artigo “Teatro para crianças não é brincadeira”, escrito pelo diretor e dramaturgo Max Reinert junto com a atriz Denise da Luz, ambos integrantes da Téspis Cia. de Teatro, atuante em Itajaí (SC) desde 1993. O grupo que dedica boa parte de seu repertório artístico para criação de peças infanto-juvenis traz um relato abrangente de seus processos de criação e da relevância social, cultural e política de dedicar seu olhar para esse público. Em seu texto, podemos observar direcionamentos dado pelo encenador para desenvolver uma criação colaborativa com os demais artistas envolvidos em cada projeto de encenação.

Para finalizar a seção de artigos, publicamos o texto “Percursos cênico-pedagógicos da mise-en-scène: poéticas da encenação em Hamlet e Hamlet Máquina” de autoria de Bárbara Tavares. A autora traz o relato das experiências de direção de três discentes no curso de especialização em Educação e Arte Contemporânea na Universidade Federal do Tocatins (UFT). Olhares distintos sobre textos de William Shakespeare e Heiner Müller apontam possibilidades poéticas e pedagógicas para criação entre o teatro e o audiovisual.

Além desses artigos e da entrevista citada, publicamos ainda uma crítica inédita de Thereza Helena (MT), crítica do site Parágrafo Cerrado e também docente da MT Escola de Teatro, sobre o espetáculo Einstein on the Beach (1976) de Robert Wilson e Philip Glass. A autora traz uma série de questionamentos ao encenador acerca de seu processo criativo e destaca a possibilidade de análise crítica a partir de um material fílmico de obras icônicas do teatro internacional e estreadas décadas atrás.

Esperamos que este dossiê, assim como todos os outros já publicados pela Revista Farofa Crítica, possa aguçar o olhar dos nossos leitores sobre o fazer artístico e, especificamente, sobre a prática da direção teatral.

Para acessar o documento em PDF com a Revista completa, basta clicar no link abaixo.

Boa leitura!

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